O consumo ou a desempenhar um papel central na configuração das relações sociais
Bom Dia SC – Em primeiro lugar, na era da globalização, marcada pela intensa circulação de informações, bens e valores simbólicos, o consumo deixou de ser apenas uma prática ligada à necessidade material e ou a desempenhar um papel central na configuração das relações sociais. Cada vez mais, o indivíduo é reconhecido, avaliado e inserido em grupos não por seus princípios éticos, talentos ou vínculos profissionais, mas por aquilo que consome – seja em forma de produtos, marcas, experiências ou estilos de vida. O pertencimento social, antes construído em torno de vínculos comunitários, culturais ou mesmo profissionais, hoje se orienta majoritariamente pelas afinidades de consumo.
Destarte, nesse novo cenário, até mesmo o coleguismo profissional – laço tradicionalmente sustentado pela convivência no ambiente de trabalho e pela solidariedade entre pares – cede espaço à lógica do consumo. Colegas deixam de se conectar apenas por funções em comum ou pelo objetivo coletivo da organização, e am a se aproximar ou se afastar conforme gostos pessoais, marcas preferidas, destinos de viagem, ações alimentares ou estéticas. Em muitos ambientes, o que gera afinidade não é o comprometimento profissional ou o desempenho técnico, mas sim o alinhamento com determinados estilos de consumo que se tornam critérios implícitos de aceitação e status.

A ética do consumo se sobrepõe à ética da convivência
Em última análise, as redes sociais digitais potencializam esse fenômeno, funcionando como vitrines simbólicas em que o indivíduo se apresenta ao mundo por meio do que consome. Mostrar a roupa de uma grife, a experiência gastronômica refinada ou o mais recente gadget tecnológico se tornou uma maneira de atrair reconhecimento e pertencimento. Nesse contexto, a afinidade social, inclusive no espaço de trabalho, torna-se menos uma questão de valores compartilhados e mais uma questão de compatibilidade estética e simbólica. A ética do consumo se sobrepõe à ética da convivência.
Por conseguinte, assa lógica traz implicações preocupantes. O estreitamento das relações humanas aos critérios de consumo exclui quem não tem o aos bens ou à linguagem simbólica dominante. Gera-se uma forma sutil de segregação social, em que o valor do indivíduo é medido por sua capacidade de acompanhar padrões impostos por um mercado globalizado e, muitas vezes, excludente. Profissionais competentes podem ser marginalizados não por sua “performance”, mas por não pertencerem a um determinado círculo de consumo. A meritocracia, já questionada em diversos contextos, torna-se ainda mais frágil diante da crescente valorização do consumo como chave das relações humanas.
Destarte, compreender que o consumo tem pautado as relações sociais na globalização implica reconhecer transformação profunda nas estruturas de convivência.
Em epítome, o que antes era regido por vínculos sociais, culturais e profissionais mais sólidos, hoje se fragiliza diante da superficialidade dos laços mediados por preferências de consumo. Essa realidade exige reflexão crítica: será possível resgatar a centralidade do humano e da convivência ética em um mundo onde a aparência e o poder de compra se tornaram critérios determinantes de pertencimento?
Prof. Dr. Adelcio Machado dos Santos
Jornalista (MT/SC 4155)
